sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A Estrada II

Não há nada no mundo que se compare a uma Coca-Cola e um pote de batatas Pringles. De preferência, nos sabores originais. Nada de diet, light, integral, com queijo ou com cebola. Melhor ainda se a Coca estiver gelada e a batata não estiver dentro da sua embalagem de nascença. Aquele cilindro é horrível. Não sei onde Fredric Baur estava com a cabeça quando o inventou. Além de sujar a mão, dá bastante trabalho pegar as que estão no fundo. E é uma injustiça com os fãs mais fiéis ao produto, que por causa dos seus magníficos e invejáveis tecidos adiposos, não conseguem nem enfiar a mão no pacote. Aliás, aproveitando o momento oportuno, seria ótimo também que a Coca viesse ainda fechada, com seu gás todo conservado; porque Coca sem gás é que nem Nescafé frio ou Nestea quente.

Opa! Metade da Coca-Cola já foi só enquanto eu dizia isso. Mas deve-se sempre ter um cuidado especial para não acabar a Coca antes da Pringles, porque quando as batatas acabarem você terá sede, e aí irá precisar da Coca. Na verdade, uma garrafa de 600ml pode resolver o problema. Só não deixe sobrar. É pecado ter Coca e não ter quem a queira beber. Porém, se você for como o meu menino, então você dará conta dela sem problemas. E que momento ótimo para um refrigerante bem gelado; o dia está quente e não há nuvens no céu.

A caminhada está tranquila, passando agora por um longo declive. O singelo garoto diminuiu muito o passo, deixando o corpo descer pelo caminho à própria vontade, apenas aproveitando a leve brisa que vinha no sentido contrário, fazendo os cabelos suados balançarem e se refrescarem. Então fechou seus olhos e apenas curtiu o momento, como se ele fosse acabar em cinco minutos. Embora ele estivesse andando mais rápido do que imaginava e muito mais rápido do que queria, ele ainda levaria alguns meses para chegar ao fim da longa inclinação. Agia como se apenas ele existisse no mundo, e ignorava completamente todas as pessoas que surgiam à sua volta, sobre as velhas conhecidas poças do bosque. O que elas faziam? O que elas queriam? Ele já estava cansado de saber.

Cada vez que olhava para os dois lados da estrada, via o bosque repleto de cenas diferentes, com pessoas diferentes, fazendo coisas diferentes, mas já estava entediado, ainda mais porque nos últimos dias, ou até mesmo nas últimas semanas, todas as cenas foram repetitivas, sem nada de novo. Hoje então ele não havia olhado para o bosque nenhuma vez desde que amanhecera, e ele provavelmente jamais saberá que isso fora o maior desperdício de oportunidade dos últimos tempos. Mas vamos nos focar em coisas boas. Por exemplo, desde a última vez em que o vi, meu menino mudou, e para melhor, de forma geral.

Não veste mais roupas fora do tamanho, nem usa mais um tênis velho, embora o cabelo esteja estranho. Antes possuía um corte padrão, normal, ou pelo menos eu não havia notado nenhuma anormalidade. Não costumo sair muito de casa, mas era um corte de cabelo bastante comum entre as pessoas que me visitavam. Agora, porém, seu corte de cabelo estava completamente desordenado. Era como se tivessem repartido seu cabelo em 8 partes e dado cada uma para diferentes pessoas cortarem na altura que quisessem. Enfim, ao menos é um corte original. Mas as calças, a camiseta e os tênis – agora brancos como a neve – certamente foram comprados há pouco tempo, o que de fato dava um ar mais normal ao menino.

***


Uma simpática cozinheira criando empadas. Olhos fechados. Um casal de namorados. Olhos fechados. Um rapaz caindo de cabeça no chão. Morte cerebral. Olhos fechados. Uma sereia vestindo azul e branco e um rei oriental. “Meu garoto, você deve encontrar um reino grande o bastante para suas ambições. Este lugar é pequeno demais para você.” Pobre primogênito. Pobres somos nós que erramos e erramos. Amaldiçoados sejam aqueles que... Olhos fechados. E ambos eram iguais. Olhos fechados.

Corpos unidos, inseparáveis para sempre até que a noite acabe. Olhos fechados. Apenas alegorias. Olhos fechados. Apenas uma tentação; uma tentação com língua bifurcada. Olhos fechados. Lembranças. Agora, apenas lembranças. Olhos fechados. Uma ilha: um pouco mais de 1 quilômetro e meio de comprimento, por meio quilômetro de largura. E você de olhos fechados? Por quê? Por que você fica aí com seus olhos fechados enquanto todo o bosque está tentando mostrar o que você deixou para trás?

***


Ele está bem, e fico feliz. Vejo que ele está bem, e que ficará bem. Está feliz, embora sua felicidade seja tão sensível quanto os minúsculos fios de cabelo que insistem em ficar entre suas sobrancelhas. E será feliz, embora para isso precise primeiro superar os maiores desafios.

Enfim, olhos abertos. A claridade ofusca seus olhos. O sol está mais forte, e o dia mais quente. Finalmente olha para os lados, e se surpreende ao ver uma cena que jamais havia visto. Surge no bosque uma mulher, em pé e de frente para ele, com um sorriso humilde e sincero. Ao seu lado, sentado no chão sujo e distraído em seu próprio universo, havia um pobre pescador. Mas era ela que importava agora. Ela queria falar alguma coisa. O meu menino aguçou seus sentidos, e prestou atenção apenas no que ela tinha a dizer. Todo o resto pareceu fazer silêncio, inclusive o vento. A senhorita então abriu sua boca levemente e disse com sua doce voz: “Abrace-a.”

Ela diz mais alguma coisa em seguida, mas o essencial já havia sido dito. E o pouco que ela disse fez todo sentido para ele. Como retribuição, ele sorriu-lhe. O sorriso verdadeiro que só a felicidade consegue criar. E então mergulhou em pensamentos. Sua mente viajando para o infinito. Lembrou-se de conselhos recebidos há meses, ou há anos. Lembrou-se de que nunca teve o hábito de seguir conselhos. E apenas não viajou mais nos seus pensamentos porque tropeçou numa pedra e caiu de joelhos no chão; aterrissagem forçada.

E doeu. Voltou a si. Um pouco assustado, olhou para o seu lado e viu que havia um círculo de pedras. Dentro do círculo, uma placa, daquelas do tipo “Não pise na grama”. Nela estava escrito, com muita clareza: “2009”. Um simples número, como se fosse um marcador de distância da estrada. Até aqui, meu jovem, você já andou 2009 metros. Ou 2009 quilômetros. E a estrada continua.

Olhou de volta para o bosque e viu que a senhorita agora dançava com uma divindade marinha, um rei do oceano profundo. Ele não se lembrava de ter visto aquele ser ali antes, mas logo percebeu que ele era o mesmo pescador que havia há pouco, só que agora radiante e majestoso. Ambos sorriam e dançavam com alegria. Pode ver o sorriso ainda presente no rosto da jovem. E desejou do fundo do seu poço de incertezas que algum dia tivesse tamanha felicidade.

Enfim, respirou fundo e se levantou. Ia voltar a caminhar, mas outra coisa chamou sua atenção. Viu que havia algo atrás da placa no chão. Aproximou-se e então viu, e riu. Quietos e imóveis, esperavam por ele uma garrafa de Coca-Cola suando e um pote de Pringles aberto.

Não há nada no mundo que se compare a uma Coca-Cola e um pote de batatas Pringles. Pegou-os e voltou a caminhar. Havia um caminho a percorrer e a estrada o chamava. Venha, venha, mas não feche seus olhos.

Alex

2 comentários:

Foo Bar disse...

Stephen King também tem essa irritante mania de começar e acabar um conto/capítulo/estória com a mesma frase/idéia.
Você chegou a ler o On Writing?
Ah, ele também tem problemas de Alzheimer, e presume que o resto do mundo tem, colocando múltiplos assuntos em uma mesma frase ou até na mesma oração.

Anyway, vamos fazer alguma coisa esse final de semana?

Ceci disse...

Gostei!!
Nossa Alex, você não deixa de me surpreender com seus contos, e seu jeito de escrever.

Gostei daquele começo e fim, e juro que não estou falando só pelo que o Edu comentou...eu já ia falar isso...e eu não li nada do senhor King não jajajaja.

Concordo com as suas idéias sobre o pringles, da coca não pq eu nem gosto muito e prefiro sem muito gas jajaja

E sabe, dessa vez, seu menino teve uma ligeira cota de você...em algumas frases o senti.

Bjos!!!...continue escrevendo! (sei que o fará!)